As flores desabrocharam da crista das ondas. Do fundo do mar saía uma maviosa canção e ao largo apareceram sulcos que aos poucos vinham-se aproximando na indefinição do horizonte distante. A medida que a distancia tornava-se insignificante as formas vinham-se revelando. Fizeram um circulo ao largo e começaram a rodar no sentido dos ponteiros do relógio enquanto ouvia-se a canção que se tornava cada vez mais bela, mais audível. Da terra os adultos viam as crianças inquietas circulando de um lado para o outro murmurando coisas ao ouvido umas das outras. Essa canção só era audível pelas crianças e também pelas formas que se aproximavam. Juntaram-se, fizeram também um grande círculo e começaram a rodar no sentido contrário aos ponteiros do relógio. Os anciãos viam os círculos da roda no mar e na terra e questionaram do porque dessa roda e da alegria dessas crianças...também questionaram a razão desse movimento em sentidos contrários, mas após uma leve reflexão chegaram a conclusão que os movimentos contrários criam pontos de encontro, pontos de contacto no espaço e desenvolve uma energia altamente renovável. Os círculos se aproximavam como que atraídos por uma energia maior ( a energia do amor ), a canção tornava-se ainda mais audível. Era tardinha, o sol punha-se no horizonte e pintava acasalando em harmonia o céu e a vasta extensão de água com cores alegres que também vibravam ao ritmo dessa canção dos Deuses. As nuvens sorriam e atiravam beijos à Terra. Dos outros extremos do arquipélago vinham beijos transportados na crista das ondas e afagos vindo ao sabor da brisa. Os pássaros marinhos não ficaram indiferentes a essa onda de amor e também juntaram-se à festa e voavam de um círculo ao outro tocando ao de leve com as suas asas coloridas ora as crianças, ora esses seres que se aproximavam cada vez mais da praia como que lhes atribuindo uma bênção vinda dos Céus. A medida que se aproximavam da praia descortinavam-se as formas... eram formas elípticas convexas. Furei o protocolo do momento e me aproximei a fim de enxergar de perto essa maravilha e saber de que era composto o círculo marinho e não tardei a aperceber-me de que esses seres que vinham devorando a distância entre o mar aberto e a praia eram umas tartarugas. As crianças dirigiam-se também elas à praia. Era como se tivessem marcado ali um encontro, uma reunião para decidir coisas importantes (o futuro da Terra). Dessa corrente de amor sairiam por certo decisões e acções e atomizariam esse amor a todos os cantos do mundo para que outras crianças e representantes dos animais dele pudessem desfrutar e então...só então partilhariam com os adultos essa força invencível.
Vejo sempre formas emergindo do meio da Baía do Porto Grande! Essas formas assumem plasticidade diversa. Mas também escuto sempre música no ar. As vezes acompanho essa música com um ligeiro assobiar introduzindo notas soltas perceptíveis por ouvidos sensíveis. Essas imagens e sons me perseguem em sonhos e neles coexistem outros odores e sabores de Cabo Verde.
Se penetrássemos no mundo das crianças por certo aprenderíamos muito e traçaríamos uma nova arquitectura do mundo e uma nova estabilidade. Não nos puxariam pelas orelhas mas nos mirariam nos olhos e com a doçura da voz que lhes é peculiar e sua pureza de cristal nos ensinariam os meandros desse mundo que para nós esfumou-se com a nossa entrada no mundo adulto, mundo esse em que nos julgamos sábios...vividos...experientes, mas que nos escapam coisas simples da vida. Me embriago no sorriso de uma criança. Uma embriaguez não etílica, essa doce embriaguez que nos faz sentir o seu mundo e nos desperta de novo para o sonho... sonhar sem as limitações do adulto.
Que as flores continuem desabrochando na crista das ondas.
By João Gomes da Graça em 20/02/2011 in terrAterra
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